A Pedra Dentro Da Pedra — dentro do corpo
Um Enredo
Dentro da pedra há outra pedra. Cheia, exata. Ele se mantém na completude, na inércia, sem estar em fragmento algum de observação do real. Ela fixa barreiras como blocos, acalca o chão sob o sapato, aniquila as interpretações: qual valor há de se dar a uma pedra? Sua textura intimida de forma despercebida — ela é o sacrifício aos deuses, o que nos separou do imaturo e nos aproxima do ilógico. É a coisa. Ela se mantém, se é sem dizer nada. Não há dentro — o dentro é tomado pelo fora (aquela de arenito). Queria eu, quebrar uma pedra com os dentes, mas me resta a própria mão palpar como seios. Erguem-se casas, muros, castelos, grandes, pequenas… e sempre ali, estáticas, construindo a partir da própria construção que já se deu, porque sempre houve algo daquele tamanho, daquela racionalidade proporcional a si mesma.
A pedra está na casa, arruinando quadros, desfavorecendo o sol, fixando os olhares dos vivos como em penetração. Ela não se move, parecendo que nasceu ali — e não morrerá. A pedra cabe perfeitamente no buraco do meu cu, como uma rolha, na medida. Ela não se esquece e tampouco possui inspirações para suceder seu destino, formular conceitos e ideias — nem de idas, nem de voltas —, entretanto, seu ácido gatilho negro ainda há de deslizar pel’aquela escada e descer até o ralo do banheiro; dali vai causar enchentes e deslizamentos, entranhas e tapar os olhos do sol. A pedra possui um humor ácido ímpar, diferente, acima dos conceitos do entendível. Seu charme é ser O objeto, O natural, O bruto, sem representatividade ou interpretação. Parte de mim a transformação em trabalho, em material, em caminhada.
Há tão milhares, tantas, que não se distinguem uma das outras — são iguais, entrelinhas de tantos formatos que se opõem e se parecem — mas se opõem, também, em minha forma, em meu preço; são a própria contramedida contracultural: a realidade como representação e o mal. Ninguém sabe, ninguém vê ou sente, só exigem — e como! A pedra me arruína, me dilacera, arranca os nervos, me deixa estupefato! Quero roçar minha língua calmamente naquela ponta de bico de seio até ver a pedra gozar deliberadamente, com num coma crítico. No fim ela sente pena de mim, carregando aquela plenitude de não ser, sendo uma pedra.
Agora ela está dentro do meu estômago — eu a engoli! Não causa incômodo. Dia e noite ela está lá, no mesmo jeito: firme, total, completa, ausente e gozada. Objeto divino, fonte dadaísta. Jesus, assim como eu, engoliu uma pedra — ela passou reta, aniquilando a vontade de Deus. Os anjos anseiam em possuir uma pedra dentro do corpo, mas não podem. É unicamente dos vivos, dos aliviados, dos que podem sorrir após a morte.




Aff, este texto me prendeu. Li duas vezes, mas não consegui chegar a um veredicto firme de o que seria a tal da pedra.